Os caminhos das filantropias para descentralizar poderes, conhecimentos e riquezas
Com o tema “Desconcentrar poder, conhecimento e riquezas”, o 13º Congresso GIFE recebeu centenas de participantes em Fortaleza (CE), entre os dias 07 e 09 de maio. O evento (ISP) é o maior encontro sobre Investimento Social Privado e Filantropia da América Latina e o FunBEA esteve presente representado por Mahryan Sampaio, presidente do fundo e Mariana Rico, vice-presidente, além de Semiramis Biasoli, Secretária Executiva, e Grace Luzzi, Coordenadora de Comunicação. Também participaram Erika Sanchez Saez, Fábio Deboni e Guilherme Romano Figueiredo, todos membros do conselho do FunBEA.
A partir da percepção do FunBEA, o evento apresentou uma grande diversidade que se refletiu tanto nos participantes, quanto nos temas dos debates. Foram inseridas na programação mesas que trouxeram temáticas de justiça racial, social e de gênero, além de diálogos sobre clima, natureza, democracia e tecnologia. Para Mariana Ricco, o congresso reforçou a importância das parcerias. “Quando agimos com medo, tomamos decisões erradas. Para o medo ir embora, é preciso ‘fazer junto’, se sentir parte. Redes de troca e aprendizagem são fundamentais para isso”, escreveu a vice-presidente.
O conselheiro Fábio Deboni participou das últimas oito edições do congresso e concorda que um dos pontos positivos deste ano foi a maior pluralidade de pessoas e assuntos. No entanto, também coloca que se por um lado houve um avanço na narrativa, por outro, ainda há um déficit de implementação das ideias que são ventiladas. Guilherme Romano, também conselheiro do FunBEA, concorda e explica: “a gente tem apontado muitos desafios. O racismo ambiental, as mudanças climáticas, a dificuldade de inclusão produtiva etc. E eu tenho sentido um pouco de falta de propostas, de caminhos a seguir ou a não seguir, casos específicos que deram certo e os que não deram certo, sugestões de como conseguir desenvolver novas ideias e inovações. Senti que ficamos muito nos desafios com menos preocupação de trabalhar soluções”.
Mahryan Sampaio, presidente do FunBEA, vai ao encontro destas ideias e coloca ainda que sentiu falta da presença dos grandes tomadores de decisão da filantropia durante as mesas que tratavam de temas como justiça climática, equidade racial e fortalecimento da base. “Eu vi muito mais Organizações da Sociedade Civil falando entre si, o que é um ponto de preocupação. A gente ainda fala muito para nossa bolha, para os convencidos e eu acho que isso também acaba exigindo da gente novas estratégias de linguagem, de aproximação e de escuta”, explica.
Ela foi uma das palestrantes convidadas a compor a mesa “Modelos Participativos de Doação e Financiamento” e em sua fala trouxe questões relacionadas ao método FunBEA de Filantropia de Base Territorial e de apoio indireto a partir do Desenvolvimento Institucional (DI). Além de atuar com o apoio direto (financeiro), as Chamadas Públicas desenvolvidas pelo FunBEA também apoiam movimentos, organizações e lideranças com o apoio indireto (formador e técnico), a partir de formações em DI, pois ao incentivar estes atores a olharem para si mesmos, contribui-se com o fortalecimento a médio e longo prazo de cada um deles. Semíramis Biasoli, Secretária Executiva do fundo, explica: “nós apoiamos para que eles (movimentos, coletivos e organizações socioambientais) de fato se fortaleçam para darem continuidade ao que já fazem. Para que qualifiquem e ampliem as soluções climáticas locais que implementam e o acesso aos seus públicos”, explica.
Segundo Erika Sanchez, conselheira do FunBEA e uma das palestrantes na mesa “Diretrizes para promover o desenvolvimento institucional de organizações da sociedade civil (não sem antes conversar sobre por que isso é importante)”, o tema do DI teve uma presença histórica no Congresso GIFE deste ano, o que foi chancelado pelos resultados de uma pesquisa apresentada na plenária de encerramento do evento. Nela, o Desenvolvimento Institucional apareceu em primeiro lugar como o tema que deve ser prioridade para o Investimento Social Privado investir de acordo com Organizações da Sociedade Civil. “Essa também é uma conquista das organizações. Essa consciência e essa possibilidade de falar isso para quem financia, para quem tá fazendo a gestão das doações, é uma conquista, é um avanço. E espero que ele traga muitos frutos de mudanças de modelo de apoio e de doação”, diz Erika.
O 13º Congresso GIFE também foi bastante importante para apresentar o método FUNBEA de apoio enquanto um fundo independente de base territorial. O FunBEA é um fundo multi-território que atua a partir dos princípios da Filantropia de Base Territorial. Ou seja, estando no território e integrando uma rede de atores locais com o objetivo de promover um olhar específico para as necessidades e demandas de cada território. A partir deste método, contribui-se com o fortalecimento de uma rede plural e diversa de Soluções Climáticas Locais (SCLs), conectadas às políticas públicas do território, com a criação de uma agenda comum, levando em consideração as particularidades culturais e sociais de cada local.
De acordo com Mahryan Sampaio, além de o encontro ter sido relevante para estabelecer o FunBEA enquanto essa referência de fundo territorial independente, o evento também reforçou a contribuição do fundo com as agendas de clima, justiça climática e racismo ambiental. Semíramis Biasoli adiciona que os fundos independentes tiveram destaque dentro do congresso, como por exemplo com a participação da Aliança Territorial da Rede Comuá na sessão sobre financiamento climático promovida pelo iCS, a partir da compreensão de que eles já realizam esse trabalho de desconcentração de poder, riqueza e conhecimento, por meio da atuação territorial. Para ela, essa descentralização é o caminho para o enfrentamento à crise climática. Sobre a pauta clima, Semíramis aponta que o tema esteve presente, mas reforça a necessidade de colocá-lo cada vez mais no centro dos debates. “As questões climáticas precisam permear toda a qualquer definição de futuro e de tomada de decisão no presente”, afirma.
Nesse sentido, Mahryan Sampaio coloca que o evento foi uma oportunidade de apresentar o FunBEA como um fundo com expertise em atuar em contextos de pós-emergências e desastres climáticos (vide a Chamada Pública para Justiça e Educação Ambiental Climática lançada em 2024), um conhecimento que se torna cada vez mais fundamental em um contexto de agravamento dos impactos das mudanças do clima. Nesta Chamada, foram apoiadas 18 organizações e 5 lideranças com atuação no litoral norte de São Paulo, território atingido pela maior chuva já registrada no Brasil em 19 de fevereiro de 2023. O apoio via Chamada Pública fortaleceu diretamente 1.200 pessoas que fazem parte das organizações apoiadas. Essas organizações trabalham em 136 comunidades nas 4 cidades do Litoral Norte de SP e impactam positivamente mais de 55 mil pessoas.
Por isso, o FunBEA defendeu durante todo o congresso a importância de alocar recursos na sociedade civil. Aqui, falamos de destinação do Investimento Social Privado em grantmaking. É verdade que essa é uma estratégia que demanda uma infraestrutura e inteligência que levam tempo para serem consolidadas. Mas é justamente aí que entram os fundos independentes organizados junto à Rede Comuá: é estratégico fazer com que esse investimento seja feito por meio dos fundos independentes para a justiça socioambiental, pois estes já possuem toda uma capilaridade e articulação com os territórios e comunidades. Assim, fica o convite (e o desafio) de como fazer que as parcerias entre o ISP e os fundos independentes ganhem escala, contribuindo com a efetiva desconcentração de poder, riqueza e conhecimento.